O Grupo Corpo, companhia de dança contemporânea, estará em Florianópolis para uma curtíssima temporada no Teatro Ademir Rosa, nos dias 4 e 5 de outubro. O programa tem dois de seus balés mais pedidos: "O Corpo" (2000), com trilha de Arnaldo Antunes; e "Benguelê" (1998), com música de João Bosco. Pode-se dizer que são criações antípodas – o urbano e o telúrico, o contemporâneo e o ancestral, o pop e a dança popular – e complementares no seu afeto brasileiro, traduzidas na movimentação ímpar da companhia mineira.
A temporada do Grupo Corpo junta no programa duas obras de estética e ambientação muito diversas. As duas coreografias de Rodrigo Pederneiras, reunidas nesse programa, traduzem a brasilidade urbana e sertaneja, do Sudeste e do Nordeste, do tecnopop vertiginoso e da tradição em artesania.
O Grupo Corpo tem patrocínio master do Instituto Cultural Vale e da Cemig, e patrocínio do Itaú Unibanco, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura.
O Corpo
Com o palco às escuras, as vozes filtradas puxam o mote: pé/mão/pé/mão. No fundo, piscam luzes vermelhas como as de um painel eletrônico. Os bailarinos, de malha preta pontuada por amarrações e volumes, mergulham na batida tecno enquanto as palavras (mão/umbigo/braço) vão se tornando mais e mais percussivas, mais som e menos significado. Tambores eletrônicos ressoam, permeados por melodias de várias origens – do funk à música árabe, do baião ao reggae.
Assim começa "O Corpo", a primeira criação para a dança do compositor, escritor, poeta e performer Arnaldo Antunes. Ele partiu para uma tradução musical, sonora e semântica do corpo, como organismo e como engrenagem, mecanismo. É o corpo, então, “esse composto de ossos carne sangue órgãos músculos nervos unhas e pelos” que preside a peça de oito movimentos gravada com instrumentos acústicos, elétricos e eletrônicos; ruídos orgânicos como grunhidos, gritos e sangue nas veias fundem-se com guitarras, violões, teclados, baixo, percussão e as vozes de Arnaldo, Saadet Türkoz e Mônica Salmaso.
Neste balé, que celebrou no ano 2000 os 25 anos do Grupo Corpo, Rodrigo Pederneiras arquitetou movimentos mais secos e vertiginosos para a companhia. A pulsação ao mesmo tempo tribal e futurista incorpora-se nos movimentos, que vão do fetal, intrauterino, ao autômato.
O linóleo é vermelho e o cenário virtual, projetado por Paulo Pederneiras, faz a sincronização de luzes vermelhas em diversas saturações, muitas vezes acompanhando a trilha e dialogando com graves e agudos; um quadrado branco delimita, aqui e ali, o espaço cênico.
O Corpo (2000)
Coreografia: Rodrigo Pederneiras
Música: Arnaldo Antunes
Cenografia e iluminação: Paulo Pederneiras
Figurino: Freusa Zechmeister e Fernando Velloso
(duração: 42 minutos)
Benguelê
Negro, árabe, indígena; popular e erudito; oceânico e desértico. É intenso. A peça musical de João Bosco, artista mineiro e universal como é o Grupo Corpo, transita pela miscigenação amorosa do Brasil a partir do jongo eternizado em 1965 por Clementina de Jesus (a canção Benguelê, de Pixinguinha e Gastão Vianna), que surge em arranjo a capela. São onze temas especialmente criados (ou recriados) por Bosco, iluminados pela Mãe África e enriquecidos pelas influências cruzadas em uma festa brasileira.
A saudade do chão natal, porém – o banzo – é uma origem possível da palavra que dá título ao balé: a fusão de Benguela, região situada ao sudoeste de Angola, com o fonema lê − em quimbundo, nostalgia, saudade. O sentimento do banzo, melancólico e ao mesmo tempo enérgico, preside a trilha de Bosco.
A música negra de raiz, produzida pelos descendentes de escravizados no Rio de Janeiro − é evocada em Tarantá, Carreiro Bebe e, principalmente, em Benguelê. Pixinguinha é citado também, com trechos de 1 x 0 (inspiração do choro-goleada) de e Urubu Malandro.
Essa rica mistura das influências europeia, oriental, do sertão e da rica negritude ganhou a roupagem de uma banda de feras: além do próprio Bosco (violão acústico e vozes) contou com Jacques Morelenbaum (violoncelo), Osvaldinho do Acordeom (acordeom), Proveta (sax e clarineta), Ricardo Silveira (viola de 12 e violão de aço), Nico Assunção (contrabaixo), Robertinho Silva e Armando Marçal (percussão), além do tenor Sandro Assunção (uma das vozes de Travessia).
“Benguelê é explosivo”, dizia o coreógrafo Rodrigo Pederneiras na estreia do balé, em 1998. Tida como a criação mais fincada na referência das danças populares brasileiras até então, a coreografia repleta de marcações de pé, de pélvis, de ombro, muita mão no quadril e remelexo de cintura se desdobram no festivo, no ritualístico, no ancestral mesmo, com figuras humanas vergadas pelo tempo e imagens animalizadas.
A ocupação do espaço é, na maior parte do tempo, anárquica, frenética; a exceção é no momento da Travessia, quando os bailarinos ocupam também uma passarela que divide o palco em dois planos. A cenografia de Fernando Velloso e Paulo Pederneiras, em tons escuros de breu e grafite, faz contraponto com a mistura final de todas as cores nos figurinos de Freusa Zechmeister, que adota o branco como matriz e trabalha com a sobreposição de tecidos.
Se nos primeiros três quartos do espetáculo, o rito afro, o jogo de roda, a quadrilha, os cortejos e as danças dos devotos se misturam, no palco e nos ouvidos, o final é pura festa, com a coroação do Rei do Congo explodindo em cores e alegria.
Benguelê (1998)
Coreografia: Rodrigo Pederneiras
Música: João Bosco
Cenografia: Fernando Velloso e Paulo Pederneiras
Figurino: Freusa Zechmeister
Iluminação: Paulo Pederneiras
(duração: 41 minutos)
Ingressos à venda no site DiskIngressos: INGRESSOS ESGOTADOS
:: Sessão do dia 04/10
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