O Museu Victor Meirelles abre na próxima quarta-feira, dia 19 de abril, a exposição “in Útil Paisagem”, de Carlos Asp. O evento se inicia às 18 horas, com o tradicional Encontro com o Artista, onde o expositor conversa com o público sobre a sua trajetória artística e suas obras.
Gaúcho de Porto Alegre, Carlos Asp tinha apenas 17 anos quando expôs suas primeiras gravuras naquela cidade. Hoje, aos 67, está completando 50 de carreira artística, ao mesmo tempo em que celebra os 40 anos em Santa Catarina, a maior parte deles em Florianópolis.
O ponto de partida da exposição “in Útil Paisagem”, composta por desenhos, fragmentos de canções, poemas e palavras que vão surgindo no seu ateliê on the road, como ele mesmo define, é a música. Entremeadas pela canção Inútil Paisagem, de autoria de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira, que dá nome à mostra, Carlos Asp nos convida a visitar a sua própria memória, através das diversas paisagens pela ilha de Florianópolis, por Porto Alegre, pela Suécia de seus antepassados e pelo mundo afora, perpassando a física quântica e os campos relacionais, um conceito que sugere o movimento, a sincronia com o pensamento, como um radar ativado todo o tempo.
Asp conta que, “após um acidente vascular no encéfalo, conhecido como AVE, um incidente geográfico no interior da cabeça, percebi que a minha audição estava melhor e as canções passaram a se sobressair, assim as letras e o som foram pensados como paisagens emocionais, os textos desenhados como paisagens, paisagens sintéticas”.
Seus trabalhos se caracterizam por desenhos que se tornam pinturas, quase esculturas, pela saturação de camadas de grafite aplicadas sobre os papéis que, por sua vez, são caixas de chá, de remédios, de alimentos, embalagens desmontadas variadas e bulas que, em suas mãos, tornam-se o suporte para as suas anotações visuais, as palavras e, daí, os campos relacionais. A explicação do artista para isso sugere uma comunicação potente e total entre as paisagens, as músicas e as memórias. Diz o artista: “Parto do princípio da física quântica que diz que, quando campos de energia se aproximam, muitas informações migram de uma parte para a outra”.
A intenção da exposição “in Útil Paisagem” é, portanto, mostrar algumas séries distintas de trabalhos que são sempre fruto do mesmo indivíduo. Ao concretizar a construção de um painel com informações de múltiplas obras, numa combinação de situações ou conceitos que podem se relacionar entre si, o artista retoma a física quântica e, novamente, o conceito do campo relacional, com a constante migração de informações entre si.
“Doutor honoris causa em causa própria, frequento a Academia da rua, guiado sempre pelos campos de energia que, quando se aproximam, fazem migrar informações de um lado para outro e que acabam por resultar em interferências e intervenções nos impressos encontrados pelo caminho, a mim permitidas pela liberdade poética que a ninguém cabe tirar. Apesar de dizer que menos é mais, me considero um barroco que mistura uma coisa com outra, numa série de influências e questões que me chegam pela cabeça e pelos olhos. Nas composições, busco perturbar o olhar daquele que olha, numa aproximação e circularidade que interagem. Palavras, imagens e campos relacionais se fundem num sarapatel visual. Tudo é randômico, flutuante. A confusão proposital dá a possibilidade do olhar abrangente do todo para as pessoas verem o que elas têm pela frente. Por vezes, se complementa com o que está ao lado, como referenciado pela perspectiva topológica - a perspectiva do olhar incidente sobre as coisas, sobre as superfícies, um olhar não hierárquico, como o da perspectiva euclidiana, que vem desde o Renascimento”, provoca Carlos Asp.
Acreditando que cada exposição tem algum elemento dos campos relacionais, o artista observa ainda que a obra Superfície Saturada, de 2000, que faz parte do acervo do Museu Victor Meirelles, é um dos primeiros desenhos em torno desse assunto. Essa obra se relaciona diretamente com os painéis apresentados na exposição “in Útil Paisagem” e, por isso, foi escolhida para estar nesta mostra, concebida dentro do Projeto Memória em Trânsito, que está em sua 5ª edição, e cujo objetivo é propor uma reflexão sobre os artistas catarinenses dos quais o Museu possui obras em seu acervo, numa tentativa de ampliar o entendimento da poética que envolve a produção desses artistas.
Sobre Carlos Asp, o crítico de arte Rafael Vogt Maia Rosa escreve que “desde a década de 70, a produção de Carlos Asp promove aproximações alternativas para as relações convencionais entre forma e suporte. A disposição pacificada das peças atuais pode levar a pensar em uma mudança de estratégia num percurso no qual a adesão ao precário e ao processual chegou a representar dificuldades palpáveis em termos de registro e amostragem da obra. Mas o artista afirma que são “desenhos que queriam ser pinturas”. O suporte utilizado, por outro lado, é obtido por apropriação e recondicionamento de determinados componentes que poderiam parecer ainda mais ligados ao lugar de onde foram subtraídos do que àquele em que estão emoldurados. Essa rede plana - caixas de medicamentos desmontadas, embalagens de papelão, bulas - projeta-se como uma operação cifrada que acaba por perturbar a coesão desses quadros. As retículas padronizadas na superfície se adequaram às propriedades idiossincráticas de um campo distante da tela, exposto ao reverso ou do modo como possibilita ser o espaço para uma ação que é padronizada na medida para que não se desvincule da atividade manual da qual resulta.
“Dessa maneira, a vocação declarada dos trabalhos retoma um sentido ambíguo, já que afirmar que esses Planos são desenhos ou relacioná-los à pintura é dissolver essas duas categorias e requalificar a experiência plástica diante de uma condição dúbia na qual as formas não gozam de autonomia porque continuam sempre retomando um processo que é reiterado como mais significativo do que seus resultados parciais.”
Desenhista. Carlos Asp foi aluno, em cursos livres, de artistas como Paulo Porcella, Danúbio Gonçalves, Carlos Vergara, Paulo Roberto Leal, Tomoshigue Kusuno, entre outros. Começou sua trajetória nos anos 70, quando participou do JAC – Jovem Arte Contemporânea, no Museu de Arte Contemporânea de São Paulo e, do Arte Agora I: Brasil 70-75, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro como artista convidado. Em Porto Alegre, fez parte do Nervo Óptico, pelos idos de 1975. Entre 1987 e 1988, participou do 10º Salão Nacional de Artes Plásticas da Funarte/MinC. Foi professor do Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina – Udesc. Em 2015, num diálogo com o autorretrato geométrico de Flávio de Carvalho, expôs os campos relacionais na 10ª Bienal do Mercosul, em Porto Alegre. Participou da 3ª Mostra do Programa de Exposições 2016, realizada pelo Centro Cultural São Paulo, em homenagem aos 40 anos do Nervo Óptico. Atualmente, está participando da mostra Nervo Óptico: 40 Anos, na Fundação Vera Chaves Barcellos, na Sala dos Pomares, em Viamão/RS.
A exposição “in Útil Paisagem”, de Carlos Asp, fica no Museu Victor Meirelles até 24 de junho de 2017. A entrada é gratuita. Ao som do piano de Antônio Carlos Jobim e na voz de Elis Regina, Inútil Paisagem, claro, não poderia estar ausente desta mostra. Abaixo, a letra de Aloysio de Oliveira.
Serviço:
O quê: Exposição “in Útil Paisagem”, de Carlos Asp
Abertura: Dia 19 de abril, quarta-feira, às 19 horas
Encontro com o Artista: às 18 horas
Local: Museu Victor Meirelles
Rua Rafael Bandeira, 41 – Centro – Florianópolis
Telefone: (48) 3222-0692
Fonte: Museu Victor Meirelles